16 de abr. de 2011

Distopia


Governos,
instituições  e conglomerados de
mídia  q
ue  insistem
em  tratar  psicopata
homicida como caso

de  polícia  devem
estar  ruins  da
cabeça



Antônimo de utopia, a palavra distopia designa o pior dos mundos. Em sentido estrito, “utopia” significa “lugar nenhum” ou “não lugar”. Na prática, utopia virou sinônimo de “lugar bom”, como no título homônimo da famosa obra publicada por Thomas More em 1516, onde se propõe uma sociedade ideal. De acordo com John Carey, esse significado é fruto de uma confusão da primeira sílaba “u” com o grego “eu”, como em eufemismo ou eulogia. Como resultado seria inventada a palavra “distopia”, significando lugar ruim. O primeiro exemplo conhecido dessa confusão veio em 12 de março de 1868, quando John Stuart Mill fez seu discurso na Câmara dos Comuns a respeito do debate sobre a igualdade religiosa na Irlanda, chamando o governo de distópico, ou cacotópico. Posto que utópica é alguma coisa boa demais para ser praticável, ao passo que o governo favorecia algo muito ruim para ser praticável.




Talvez em nenhuma
outra época a cultura do
medo foi um produto tão lucrativo  para  os  donos
do poder e dos meios de comunicação de massa






Cinqüenta anos antes Jeremy Bentham empregou o termo “cacotopia” em seu Plano de Reforma Parlamentar, na Forma de Um Catecismo (1818): “Como um complemento para a utopia (ou o assento imaginado do melhor governo) supõe uma cacotopia (ou o imaginado assento do pior governo) descoberta e descrita”. A raiz de cacotopia deriva do grego kakos (mal), como em cacofonia. Referindo-se à palavra inventada por Bentham, Mil homenageia seu mentor e professor na teoria do Utilitarismo. O mesmo Bentham que dotou nossas distopias contemporâneas com um de seus símbolos mais perenes, o sistema perfeitamente “racional” de vigilância conhecido como Panóptico. (imagens acima, à esquerda, Maria-robô em Metrópolis, 1927, direção Fritz Lang; à direita, em Fahrenheit 451, 1966, a missão dos bombeiros é queimar todos os livros, direção François Truffaut, adaptação da obra de Ray Bradbury. Imagens abaixo, à esquerda, Alphaville, direção Jean-Luc Godard, 1965, onde a poesia vai criar problemas para o computador que controla todo mundo; à direta, thx 1138 foge do mundo subterrâneo controlado e consegue encontrar a liberdade, THX 1138, direção George Lucas, 1970)




Adolf Hitler deve
estar se c
ontorcendo de inveja no inferno







Carey faz uma distinção bastante objetiva de tudo isso: quando fruto da imaginação, bons e maus lugares são a mesma coisa, utopias ou não-lugares. Para ser uma utopia, um lugar imaginário deve ser a expressão de um desejo. Por outro lado, para ser considerado distopia, deve ser a expressão do medo. As jornadas em direção a esses lugares imaginários tornaram-se um elemento básico da imaginação moderna. Por todo o século XX, essas jornadas surgiram do desejo de controlar o futuro e imaginar técnicas para alcançá-lo, apenas para que a seguir se estabeleça o medo de perder o controle dessas técnicas. Na opinião do historiador da arquitetura Lewis Mumford, qualquer um que conheça a literatura utópica dos dois últimos séculos teria uma idéia melhor sobre como as coisas virão do que um leitor de jornal que siga as notícias diariamente. Em 1960, o romancista britânico Kingsley Amis concluiu algo semelhante em seu estudo sobre a literatura de ficção científica.





O totalitarismo
já mudou de roupa faz
tempo
. As fardas estão
fora de moda








Em sua opinião, enquanto há 20 anos (portanto, na década de 40) se localizariam sociedades totalitárias em Vênus ou no século 13, na década de 60 elas são localizadas na Terra (em algum lugar nos próximos 100 anos ou mais). Os equipamentos de opressão não serão mais propriedade de tipos pseudo-aristocráticos decadentes em vestimentas cerimoniais (como o vilão Imperador Ming em Flash Gordon, 1936), mas por figuras engravatadas bem equipadas com a última tecnologia e técnicas psicológicas para a prevenção e detecção dos inimigos e/ou das potenciais ovelhas. A distopia veio à tona em meados do século XX, empurrada pelos pesadelos especulativos de gente como Yevgeny Zamyatin (Nós, My, 1924), Aldous Huxley (Admirável Mundo Novo, Brave New World, 1932) e George Orwell (1984, 1949). Outros poderiam ser citados, mas o importante é compreender que o cenário distópico não é exclusividade da ficção científica. Durante as décadas de 50 e 60 chamou-se distópica a uma tendência na literatura e no cinema, focada nos medos em relação ao mundo moderno: em relação à automação, destruição atômica, padronização e consumismo.