
Pode também ser interpretada como uma oferta do eu enquanto vítima conectando-se à reciprocidade entre insulto e autodepreciação. Pode ainda referir-se à renúncia de poder necessária a troca sadomasoquista. Demonstra também o potencial para fazer do “outro” um objeto na militarização do sentimento que remove a compaixão dos atos brutais. Pode ser também um comentário sobre a troca entre aquele que observa e o objeto observado. Cut Piece decreta a responsabilidade que os espectadores (a platéia) devem assumir na experiência estética (2).
Desconstruíndo a supostamente neutra relação entre sujeito e objeto existente entre platéia (público, espectadores, observadores) e objeto de arte, Yoko Ono apresentou uma situação onde o/a observador/a se implicava no ato potencialmente agressivo de desvelar, desnudar, um corpo passivo. O fato de se tratar de um corpo feminino carregou ainda mais a performance com as questões de gênero. Enfatizando a reciprocidade na maneira como platéia e objetos tornam-se objetos uns para os outros, Cut Piece demonstra como a observação irresponsável pode chegar a destruir o objeto percebido (3).
Notas:
1. SCHNEEMANN, Carolee. More Than Meat Joy: Complete Performances, Works and Selected Writings (1979). IN WARR, Tracey; JONES, Amelia. The Artist’s Body. London: Phaidon, 2000. P. 197.
2. STILES, Kristine. Between Water and Stone – Fluxus Performance: A Metaphysics of Acts IN WARR, Tracey; JONES, Amelia. The Artist’s Body… Op. Cit., p. 211.
3. WARR, Tracey; JONES, Amelia. The Artist’s Body… Op. Cit., p.74.