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Roberto Acioli de Oliveira

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3 de abr. de 2008

Rostos: Fisiognomonia (IV)

Charles Darwin


O pai da teoria sobre a evolução das espécies era de opinião que os movimentos expressivos do rosto e do corpo aumentavam bastante o poder da linguagem falada. Seu interesse na problemática fisiognomônica foi tão profundo que escreveu um livro sobre o tema. Trata-se de A Expressão das Emoções no Homem e nos Animais, publicado em 1872. Os títulos dos capítulos já mostram claramente que Darwin não tinha dúvidas quanto à pertinência de tal discussão: Princípios Gerais da Expressão, desânimo, amor, reflexão, ódio, desdém, culpa, orgulho, medo, vergonha. O renomado etologista Konrad Lorenz, no prefácio que escreveu para apresentar o estudo de Darwin, o coloca como o ponto de partida da etologia (1) (imagem ao lado, cão da raça pitbull; abaixo, orangotango). Entretanto, Darwin distingue entre expressão e fisionomia, esclarecendo que seu interesse recai sobre a busca das causas da primeira. Segundo ele, as hipóteses até então aventadas pouco ou nada esclarecem por considerarem homem e animal como criações independentes. Em seus próprios termos...

“De acordo com essa doutrina, toda e qualquer coisa pode ser igualmente bem explicada; e isso se provou ser tão pernicioso com respeito à Expressão quanto com respeito a qualquer outro ramo da história natural. Nos humanos, algumas expressões, como o arrepiar dos cabelos sob a influência de terror extremo, ou mostrar os dentes quando furioso ao extremo, dificilmente podem ser compreendidas sem a crença de que o homem existiu um dia numa forma mais inferior e animalesca. A partilha de certas expressões por espécies diferentes ainda que próximas, como na contração dos mesmos músculos faciais durante o riso pelo homem e por vários grupos de macacos, torna-se mais inteligível se acreditamos que ambos descendem de um ancestral comum. Aquele que admitir que, no geral, a estrutura e os hábitos de todos os animais evoluíram gradualmente, abordará toda a questão da Expressão a partir de uma perspectiva nova e interessante”. (2)


A partir daí, Darwin sugere alguns meios para escaparmos das opiniões do senso comum. 1) observar crianças, pois além de considerar a pureza da fonte de suas emoções, dado o pouco contato com a complexidade emocional posterior dos humanos, a intensidade com a qual são expressas é considerada muito grande; 2) observar loucos, pois além de expressar suas paixões sem nenhum controle, estas se manifestam também intensamente; 3) observar fotografias de rostos previamente galvanizados; 4) observar pinturas, ainda que Darwin tenha feito ressalvas, pois considerou que a excessiva contração dos músculos faciais pode nos induzir ao erro; 5) Observar diferentes raças humanas, especialmente aquelas que pouco contato tiveram com os europeus, buscando saber se as feições quanto à determinada emoção se repetem da mesma forma, no intuito de estabelecer se tais expressões são inatas. 6) observar animais, porque estaríamos menos propensos às influências da imaginação, já que as expressões não seriam convencionadas (3).


Chegou então a três princípios que segundo ele explicam a origem dos movimentos expressivos (4). No primeiro, uma expressão torna-se habitual quando é repetida com o objetivo de satisfazer um desejo, ainda que não se pretenda agir como indicado pela expressão (como quando alguém indignado assume uma atitude própria para a luta, mesmo que sua intenção não seja realmente atacar). O segundo princípio afirma que a expressão de alguém pode mudar para seu completo oposto quando se verifica que a intenção daquele outro que se aproxima não corresponde ao esperado (como quando um cachorro late e assume postura de ataque em relação a alguém, mudando instantaneamente para uma postura de submissão quando percebe que é seu dono quem se aproxima). No terceiro princípio, a influência de um sistema nervoso agindo independente da vontade na produção de movimentos expressivos (tremores musculares, o suor da pele). Estes três princípios agem em combinação, nunca estão isolados.


Darwin insiste na hipótese de que os movimentos expressivos, tanto em homens quanto em animais, são inatos e hereditários. O que não quer dizer que algumas expressões, apesar de sua origem inata, não requeiram certa prática até serem desempenhadas perfeitamente. Assim, ainda que a vontade e a consciência tenham um papel, não estamos necessariamente conscientes dos músculos que utilizamos para produzi-los.


Encontrar a fronteira entre os elementos instintivos e não instintivos na produção dos movimentos expressivos sempre foi o problema de Darwin. Comenta o argumento de um Sr. Lemoine, para quem se o homem possuísse um conhecimento inato das expressões, escritores e artistas não teriam a dificuldade que ele considera que tem para retratar os sinais característicos de cada estado de espírito. Segundo Darwin, este argumento não se sustenta, posto que nossa enorme capacidade de perceber mudanças na expressão de alguém não é acompanha de igual eficiência quando tentamos analisar a natureza da mudança (5). Encerra seu livro afirmando que, seja qual for a origem dos movimentos expressivos do rosto e do corpo, são eles muito importantes para nosso bem estar.



Leia também: 

Fisiognomonia (III), (V)

Notas:

1. DARWIN, Charles. A expressão das emoções no homem e nos animais. Tradução Leon de Souza Lobo Garcia. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
2. Idem, pp. 21-22.
3. Ibidem, pp. 23-27.
4. Ibidem, conclusão e os primeiros três capítulos.
5. Ibidem, p. 334. 


 

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