Este sítio é melhor visualizado com Mozilla Firefox (resolução 1024x768/fonte Times New Roman 16)

Roberto Acioli de Oliveira

Arquivos

28 de mar. de 2009

A Face do Mal (II)


“Satan é uma palavra hebraica que
significa adversário, nada mais”(...) Satã
é um título, não é nome de ninguém”(...)
O adversário de Deus (o Diabo) é chamado
diabolos
nos Evangelhos de Lucas e Mateus.
Essa palavra grega significa acusador ou
difamador; foi traduzida para o latim como
diabolus
”(...)”Porém, mais de trezentos
anos antes de Cristo, um fator de resultados
imprevisíveis fora introduzido pelos judeus
alexandrinos: ao verterem o Antigo
Testamento para o grego, traduziram
o satan hebraico para o grego
diabolos. É por isso que o Diabo do
Antigo e do Novo Testamentos
têm o mesmo nome, embora não
signifiquem a mesma coisa”(1)


Queima de Arquivo

A etimologia de Diabo vai muito longe, ainda teríamos que ver vários textos sagrados antigos, na literatura, traduções e re-traduções, as influências de outras culturas, etc. Lúcifer também não é o nome de ninguém, significa apenas “o que leva a luz” (2). Foram os padres da Igreja do século V os responsáveis pela primeira e decisiva re-interpretação do motivo por que o anjo Lúcifer foi expulso do céu. O Abismo de Fogo, um reino infernal governado por Satã e os anjos rebeldes, aparece primeiro em Enoque. Apesar da importância desse texto, alguns teólogos não aceitaram certas definições contidas no texto e o “eliminaram”. A origem dos anjos caídos e do pecado de Satã encontra-se nos versículos iniciais do Gênesis, capítulo 6.

O problema era o sexo, “os filhos de Deus” mantinham relações sexuais com as filhas dos homens! Entre os dois grupos fora rompida por desejo sexual. Enoque falava justamente dos filhos da união entre anjos e mulheres – chamados “espíritos maus sobre a terra”. Deus instruiu Rafael para amarrar o líder dos anjos e atirá-lo num buraco no deserto e lançá-lo ao fogo no dia do Juízo. Miguel deveria levar os outros anjos pecadores e sua prole para o Abismo do Fogo, onde seriam atormentados por toda a eternidade. Portanto, o pecado do Diabo foi luxúria e não orgulho. Mas os tais primeiros padres da Igreja excluíram Enoque e escreveram que Justino, martirizado em Roma no ano de 165 d. C., falou de anjos que violaram a ordem, cedendo aos impulsos sexuais e fizeram sexo com mulheres, cujos filhos agora são os demônios, os escravos da carne! (3) (imagem acima, Dia do Julgamento, século. XIII, cúpula, Florença, Itália; ao lado, A Queda dos Anjos, Apocalipse de Trier, França, ano 800; imagem abaixo, Apocalipse de Agers, de Nicolas Bataille, 1373-87)

Por Que o Diabo Anda Nu?

Embora grande parte das pinturas medievais mostre diferentes santos com os mesmos rostos, as representações das figuras mudaram entre os séculos V e XV – inclusive Jesus e o Diabo. O problema é que, se para a figura de Jesus as alterações são registradas graficamente, no caso do Diabo não o que acontece. Na Idade Média, os agentes do Diabo eram imaginados como imaginamos hoje os micróbios – sempre presentes e malignos. Enquanto a arte cristã, patrocinada pela Igreja, perder seu poder a partir do século XV, ela passa a ser apenas mais uma forma de arte entre outras. Até esse momento, a arte cristã era o grande veículo da mensagem da Igreja para as massas iletradas (4).

Pintar Jesus era fácil, mas na hora de pintar o Diabo dificuldade dos artistas era grande. Como desde sempre a Igreja havia dificultado a caracterização do Diabo, não havia nem fonte literária e nem fonte pictórica onde os pintores e escultores pudessem se basear. Os artistas criaram uma grande confusão entre o Diabo, Lúcifer, Satã e os demônios. Foi assim que os artistas foram buscar inspiração em Pã, divindade grega das florestas. Ele tinha chifres, orelhas pontudas, rabo e pés de cabra. Só que sua índole original era totalmente diferente da conotação maléfica cristã. Link também não vê Pã como o protótipo do Diabo, foram os monges que viram nele um demônio (5).

O Diabo está sempre nu, assim como Adão e Eva no paraíso. As vestimentas significam a sociedade humana. A diferença é que aquele casal foi criado nu, enquanto o Diabo foi desnudado. Apesar disso, embora tudo pareça ter começado por causa da sexualidade de Lúcifer, onde podemos encontrar em obras da Idade Média ou da Renascença os órgãos genitais do Diabo? Como os deuses tornados pagãos andavam nus, os eclesiásticos cristãos acreditavam que eles eram diabos. Nudez na arte cristã tornou-se sinônimo de degradação e humilhação para diabos, pagãos e hereges. Os criminosos eram empurrados sem roupa pelas ruas da Europa medieval e renascentista (6). Como Hipácia, primeira mulher matemática e mestra em platonismo, morta a mando de Cirilo, o bispo de Alexandria. Doze anos após a morte dela, aparece em cena o Papa Leão I.(ao lado, os muçulmanos representados como demônios, iluminura, séc. XIV)


“Leão I descreve os quatro componentes da molécula do Diabo: magia negra, judeus, hereges e pagãos. Todos eles vêm do Diabo e a ele pertencem. Leão I talvez cresse no que pregava. Mas estaria falando do adversário de Deus? Ou do adversário de Leão I? Em 1975, líderes iranianos seguiram os passos de Leão I, entoando junto com manifestantes 'América é Satã'. E em 1982, falando sobre a União Soviética, o presidente dos Estados Unidos alertou o mundo acerca do 'império do mal'. Do papa Leão I a Ronald Reagan, o Diabo é um modo de macular qualquer um que discorde dos que estão no poder. Não sei se Cirilo realmente acreditava que Hipácia era um diabo porque ela era pagã. A meu ver, isso não tem importância. Mas se o Diabo às vezes é meramente um expediente retórico, isto não significa que o mal o seja. No mesmo nível em que o Diabo não se refere ao verdadeiro mal e é um expediente retórico, o Diabo torna-se uma justificativa para o verdadeiro mal por parte de quem emprega esse expediente” (7)

Notas:

1. LINK, Luther. O Diabo. A Máscara sem Rosto. Tradução Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. P. 24.
2. Idem, p. 28.
3. Ibidem, pp. 34-5.
4. Ibidem, p. 49.
5. Ibidem, p. 53.
6. Ibidem, p. 67.
7. Ibidem, p. 70.

Postagens populares (última semana)

Quadro de Avisos

Salvo quando indicado em algum ponto da página ou do perfil, este blog jamais foi patrocinado por ninguém e não patrocina nada (cursos, palestras, etc.), e jamais "doou" artigos para sites de "ajuda" a estudantes - seja no passado, presente ou futuro. Cuidado, não sejam enganados por ladrões da identidade alheia.

e-mail (no perfil do blog).
....

COMO CITAR ESTE BLOG: clique no título do artigo, verifique o link no alto da tela e escreva depois do nome do autor e do título: DISPONÍVEL EM: http://digite o link da página em questão ACESSO EM: dia/mês/ano

Marcadores

Action Painting Androginia Anorexia Antigo Egito Antonioni Antropologia Antropologia Criminal Aristóteles Armas Arquitetura da Destruição Artaud Arte Arte Degenerada Arte do Corpo Auto-Retrato Balthus Bat Girl Batman Baudrillard Bauhaus Beckmann Beleza Biblioclasta Body Art botox Brecht Bulimia Bullying Buñuel Burguesia Butô Cabelo Carl Jung Carnaval de Veneza Carolee Schneemann Castração Censura Cesare Lombroso Cézanne Chaplin Charles Darwin Charles Le Brun Chicago Cicciolina Ciência Ciência do Concreto Cindy Sherman Cinema Claude Lévi-Strauss Claus Oldenburg Clifford Geertz Clitoridectomia Close up Código Hays Comunismo Corpo Criança Cristianismo Cubismo Cultura Da Vinci Dadaísmo David Le Breton Descartes Desinformação Déspota Oriental Deus Diabo Distopia Erotismo Eugenia Europa Evgen Bavcar Expressionismo Fahrenheit 451 Falocentrismo Família Fascismo Fellini Feminilidade Feminismo Ficção Científica Filme de Horror Fisiognomonia Fluxus Fotografia Francis Bacon Francisco Goya Frankenstein Franz Boas Freud Frida Kahlo Fritz Lang Frobenius Futurismo Games Gaudí Gauguin George Lucas George Maciunas Giacometti Giambattista Della Porta Gilles Deleuze Giuseppe Arcimboldo Goebbels Grécia Griffith Guerra nas Estrelas H.G. Wells Herói Hieronymus Bosch História Hitchcock Hitler Hollywood Holocausto Homossexual HR Giger Idade Média Igreja Imagem Império Romano imprensa Índio Infibulação Informação Inquisição Ioruba Islamismo Jackson Pollock Jan Saudek Janine Antoni Johan Kaspar Lavater Judeu Judeu Süss Kadiwéu kamikaze Konrad Lorenz Koons Ku Klux Klan Kurosawa Le Goff Leni Riefenstahl Livro Loucura Loura Lutero Madonna Magritte Manifesto Antropofágico Maquiagem Marilyn Monroe Marketing Máscaras Masculinidade Masumura Maternidade Matisse Max Ernst Merleau-Ponty Michel Foucault Mídia Militares Minorias Misoginia Mitologia Mizoguchi Morte Muçulmanos Mulher Mulher Gato Mulher Maravilha Mussolini Nascimento de Uma Nação Nazismo Nova Objetividade Nudez O Judeu Eterno O Planeta Proibido O Retrato de Dorian Gray O Show de Truman Olho Orientalismo Orson Welles Orwell Oshima Ozu Palestinos Panóptico Papeis Sexuais Papua Paul Virílio Pênis Perdidos no Espaço Performance Picasso Piercing Pin-Ups plástica Platão Pornografia Primitivismo Privacidade Propaganda Prosopagnosia Protestantismo Psicanálise Publicidade Purgatório Puritanismo Racismo Razão Religião Retrato Richard Wagner Rita Haywood Robert Mapplethorpe Rosto Sadomasoquismo Salvador Dali Sartre Seio Semiótica Sexo Sexualidade Shigeko Kubota Silicone Simone de Beauvoir Sociedade Sociedade de Controle Sociedade Disciplinar Sociedades Primitivas Sprinkle Stanley Kubrick Suicídio Super-Herói Super-Homem Surrealismo Tatuagem Televisão Terrorismo Umberto Eco Vagina van Gogh Viagem a Tóquio Violência Walt Disney Woody Allen Xenofobia Yoko Ono Yves Klein

Minha lista de blogs

Visitantes

Flag Counter
Creative Commons License
This work is licensed under a Creative Commons Atribuição-Uso não-comercial-No Derivative Works 3.0 Brasil License.