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Roberto Acioli de Oliveira

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6 de set. de 2012

Uma Baleia Politicamente Incorreta?





Em  1896  um
navio  arpoou  um
Cachalote  na costa  da
Flórida. Antes de morrer,  
cinco outros Cachalotes
atacaram o navio, que 
quase afundou (1)




Durante um bom tempo chamar alguém de baleia era uma ofensa, especialmente num país narcisista como o Brasil. Sinônimo de invisibilidade social nesse país que se vangloria de ser (inexplicavelmente) classificado como “feliz”, os gordos e as gordas evitam contato visual até mesmo uns com os outros. Quis o destino que a partir da década de 70 do século passado as baleias passassem a ser valorizadas como símbolo dos animais (e do planeta) em extinção. Contudo, mesmo assim, a maioria dos/as obesos/sas continua sendo visto e se vendo com desprezo por um mundo paradoxal que enaltece a magreza, mas que gasta milhões com propaganda para convencer as pessoas a comer lixo para que as indústrias ganhem dinheiro. Pelo menos por enquanto, as baleias estão sobrevivendo e proliferando. Apanhada na rede de uma linguagem midiática que passou a considerá-la um “gigante gentil”, nem sempre foi assim. Embora na literatura e na música que atendem ao rótulo de “Nova Era” a baleia seja “vendida” como símbolo de vida, figuras bizarras com o Leviatã do Antigo Testamento estão mais inclinados a forças de natureza maligna (imagem abaixo, ilustração de Gustave Doré, 1865). Moby Dick, sua transfiguração na literatura do século XIX, atesta esse fato. A baleia branca do romance de Herman Melville é a vilã do mundo natural que, além duplicar o interesse cada vez maior nos vilões humanos (seja na literatura, na televisão, no cinema e no Congresso Nacional do Brasil), atravessa como um grande arpão a imagem do gigante gentil. (imagem acima, Le Balenier, William tuner, 1845)






No ano de 1820, 
o baleeiro Essex arpoou
 um Cachalote no Pacífico Sul. 
O animal bateu contra o navio até afundá-lo.  Restaram  apenas
 três  sobreviventes e um
bote salva-vidas (2)







As baleias povoam muitas histórias fantásticas, parábolas religiosas, apólogos e fábulas morais e filosóficas. A literatura ocidental não podia ficar de fora. Até que Moby Dick aparecesse, o público dispunha somente de obras menores sobre o ofício do caçador de baleias – em 1956, surge uma versão hollywoodiana da saga, com Gregory Peck no papel do lunático capitão Ahab; mais uma versão para o cinema surgiu em 2011. Diga-se de passagem, numa época (o século XIX) em que o óleo de baleia era o combustível utilizado em lampiões, seria evidentemente conveniente que o grande cetáceo fosse visto como um monstro impiedoso, ainda que na maioria absoluta das espécies o comportamento dócil e curioso facilitasse sua caça – a baleia Franca, comum nas costas brasileiras, é chamada de Right Whale (Baleia Certa) pelos baleeiros europeus e norte-americanos apenas porque é fácil de arpoar e, depois de morta, ela flutua. Salvo pela única espécie de baleia que parece ter dito “não” para o ser humano. A baleia Cachalote (Physeter Macrocephalus) é a protagonista de Moby Dick, cujo comportamento desafiou o capitão Ahab. Melville escreveu o livro após passar algum tempo nos mares do sul em 1840, e consta que a caracterização de Moby Dick se baseou em dois cachalotes “históricos”. A primeira atacou e afundou o baleeiro Essex no Oceano Pacífico em 1820. A segunda foi um cachalote “branco como a neve” avistado em 1810 na ilha de Mocha, na costa do Chile, e que um jornalista descreveu no jornal em 1839 como “Mocha Dick”. O capitão Ahab convence sua tripulação a perseguir o monstro e acaba morrendo preso nas cordas dos arpões fincados no corpo da grande baleia branca que, apesar do simbolismo da paz inerente a esta cor no Ocidente, não está nem aí para os seres humanos (3).


Notas:

Leia também:

Antonioni na China
AntonioniDocs#43/50
Homunculus e a Saga do Frankenstein Alemão?
Ettore Scola e o Filme Dentro do Filme

1. WATSON, Lyall. Sea Guide to the Whales of the World. New York: E. P. Dutton, 1981. P. 174.
2. Idem, p. 175.
3. COUSTEAU, Jacques-Yves; PACCALET, Yves. La Planète des Baleines. Paris: Robert Laffont, 1986. Pp. 263-4.


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