As feministas
reagiram contra
The Dinner Party,
reagiram contra
The Dinner Party,
afirmando que a obra
reforçava a definição da
mulher em função de
critérios biológicos,
ao invés de ver a
reforçava a definição da
mulher em função de
critérios biológicos,
ao invés de ver a
identidade sexual como
uma construção histórica
uma construção histórica
Barbara Hess (1)
Enquanto a presença da cantora Patti Smih fazia marolas nos recantos machistas da industrial da música durante a década de 70 do século passado, outras artistas faziam aquilo que Rebecca Schneider chamou em 1997 de “arte do corpo explícita”. Saindo da revolução sexual da década de 60, as artistas feministas aplicaram sua crítica da cultura masculina (crucial para definir a hostilidade inicial delas em relação à pornografia e a publicidade) para realizar aquilo que esperavam se tornar uma arte da mulher. Utilizaram-se, como Judy Chicago em 1979 com a instalação The Dinner Party, de elementos como a representação abstrata dos genitais femininos e outros símbolos de feminilidade e sexualidade da mulher. Numa guerra cultural declarada, artistas performáticas como Carole Schneemann e Yoko Ono expunham seus corpos e se re-apropriavam de palavras consideradas parte do vocabulário do opressor masculino, como “boceta” e “puta”. Essas artistas perseguiam uma estética separatista articulada à suas políticas feministas mais amplas. De acordo com Marcia Tanner, o objetivo era buscar uma arte especificamente feminina. Deveria ser deliberadamente distintas do modernismo do mainstream, considerado misógino, patriarcal e inacessível. Judy Chicago, de acordo como Brian McNair uma das mais influentes praticantes dessa arte, acreditava que essa nova forma de arte seria mais cooperativa e menos competitiva (2). Chicago sempre denunciou a misoginia no universo artístico. Em 1962 chegou-se a publicar nos Estados Unidos um livro sobre a história da arte que não continha uma única referência a uma mulher artista. Quarenta anos depois, as coisas não pareciam melhores. Em 1999 Chicago ainda se queixava de...
“...Um sistema de arte
que privilegia artistas
homens, como evidenciado
pelos séculos de discriminação
contra as mulheres artistas; a omissão
de suas conquistas do Canon da história
da arte; e o fato de que mesmo hoje
apenas 5% da arte encontrada
em coleções de museus [norte-
americanos] consiste no
trabalho de mulheres
artistas” (3)
que privilegia artistas
homens, como evidenciado
pelos séculos de discriminação
contra as mulheres artistas; a omissão
de suas conquistas do Canon da história
da arte; e o fato de que mesmo hoje
apenas 5% da arte encontrada
em coleções de museus [norte-
americanos] consiste no
trabalho de mulheres
artistas” (3)
McNair esclarece que as obras e instalações resultantes, ainda que sexualmente transgressivas, eram desafiadoramente anti-eróticas para o olhar masculino heterossexual. Em 1972, Chicago, Suzanne Lacy, Sandra Orgel e Aviva Rahmani apresentaram a performance Ablutions: enquanto se escutava uma fita com testemunhos de mulheres estupradas, uma mulher nua era enrolada em gaze, outra colava rins de vacas na parede, enquanto outras duas se banhavam numa banheira contendo ovos, sangue e argila. Em 1971, Chicago apresentou Red Flag, uma litografia que mostrava um close-up extremo de parte de uma mão, uma coxa e uma sombra púbica escura. A artista explicou em 1975 que se tratava da mão de uma mulher retirando um Tampax ensangüentado de sua vagina. Infelizmente, concluiu Chicago, “algumas pessoas interpretaram o Tampax como um maldito pênis, um testamento do dano causado a nossos poderes perceptivos pela falta de imagens da realidade da mulher” (4). Evidentemente, continua McNair, muito da arte feminista desse período não era nem explicitamente sexual nem transgressiva, concentrando-se em falar das qualidades femininas e celebrar as diferenças emocionais e intelectuais entre os gêneros.
“Tanto a arte quanto
a pornografia (que têm
muito em comum em termos
da representação da mulher)
tradicionalmente mostraram
a vagina da mulher como um
receptáculo inerte, o que
continua a ser um ponto
de vista comum”
a pornografia (que têm
muito em comum em termos
da representação da mulher)
tradicionalmente mostraram
a vagina da mulher como um
receptáculo inerte, o que
continua a ser um ponto
de vista comum”
Judy Chicago (5)
Com o objetivo de honrar as conquistas da mulher ao longo dos séculos, The Dinner Party é um trabalho monumental que mistura várias técnicas. Uma imensa mesa em formato triangular com trinta e nove lugares, treze de cada lado. Cada lugar na mesa remete a uma deusa ou figura histórica do sexo feminino, no chão coberto por placas de porcelana outros 999 nomes de mulheres importantes: uma história simbólica da mulher na civilização ocidental. Quando a obra foi mostrada ao público em 1979, uma polêmica se formou em torno da instalação. Dizia-se que os pratos reproduziam desenhos de vaginas, o valor artístico de The Dinner Party foi muito questionado. Na época, Chicago afirmou que essa reação demonstrava que o problema fundamental ainda era o fato de que à mulher ainda era vetado o direito de produzir símbolos, especialmente se remeterem ao corpo da mulher – para Judy, o fato de que é através da vagina que se dão os nascimentos demonstra que não se trata de um órgão inativo. Ao escolher o formato da genitália feminina, a artista pretendia questionar o que considerava um mundo onde prevalecem as imagens do poder fálico: “Se a mulher experimenta sua vagina como um órgão inativo, isso geralmente se traduz numa passividade do eu que pode afetar outros aspectos de sua vida, incluindo sua criatividade” (6). (as imagens mostram quatro pratos, que representam, respctivamente, GeorgiaO'Keeffe, Virginia Woolf, Artemisia Gentileschi e a Judith da Bíblia)
“Naqueles
tempos, até mesmo uma
representação extremamente
simplificada da relação entre a minha
feminilidade e a minha arte me
parecia melhor do que
não ter percepção
nenhuma”
tempos, até mesmo uma
representação extremamente
simplificada da relação entre a minha
feminilidade e a minha arte me
parecia melhor do que
não ter percepção
nenhuma”
Judy Chicago em 1975,
descrevendo a década de 60 (7)
descrevendo a década de 60 (7)
Notas:
Leia também:
As Mulheres de Luis Buñuel
Luis Buñuel, Incurável Indiscreto
O Marcello de Mastroianni
Casanova de Fellini e o Infantilismo Italiano
A Bela e o Desejo de Buñuel
O Peplum e a Indústria do Espetáculo
As Deusas de François Truffaut
Casanova de Fellini e o Infantilismo Italiano
A Bela e o Desejo de Buñuel
O Peplum e a Indústria do Espetáculo
As Deusas de François Truffaut
1. HESS, Barbara. Judy Chicago. In: GROSENICK, Uta (ed.). Mulheres Artistas, nos Séculos XX e XXI. Köln: Taschen, 2002. P. 83.
2. McNAIR, Brian. Striptease Culture. Sex, Media and the Democratisation of Desire. London/New York: Routledge, 2002. P. 197.
3. Idem, p. 192.
4. SCHNEIDER, Rebecca. The Explicit Body in Performance. London/New York: Routledge, 1997. Pp. 189n27, 205n11.
5. CHICAGO, Judy. The Dinner Party. From Creation to Preservation. London/New York: Merrell, 2007. P. 274.
6. Idem, pp. 270, 274.
7. HESS, Barbara. Op. Cit., p. 78.