No começo
da época Heian
os nobres, de ambos
os sexos, começariam a
pintar os dentes de preto
para se diferenciar dos
escravos e dos
animais (1)
da época Heian
os nobres, de ambos
os sexos, começariam a
pintar os dentes de preto
para se diferenciar dos
escravos e dos
animais (1)
Na terra do sol nascente a aparência é mais do que uma face a face entre as pessoas, ela tece com o mundo um conjunto de códigos muito complexos até alcançar a indiferença. Ou melhor, a maquiagem tradicional não pretende significar nada – deve esconder os sentimentos da mulher atrás de uma máscara suave. Pelo contrário, camufla os traços da mulher japonesa fazendo-a se assemelhar a uma abstração que só faz sentido em função dos códigos próprios a cada época. Faz pouco tempo, afirma Dominique Buisson (2), uma mulher de qualidade jamais se apresentaria aos olhares sem antes clarear sua pele. Ainda hoje, uma mulher vestindo quimono pintará seu rosto de branco, evitará um rosto corado, fechará ligeiramente as pálpebras e arredondará sua boca no formato de uma cereja. Mas em 1869, um decreto da corte imperial japonesa proibiu essa maquiagem antiga – aquela das damas da corte que se pintavam com pigmento branco e os dentes de preto, raspavam as sobrancelhas e as pintavam mais no alto. Por força de lei, a moda passou a ser imitar a moda européia de então. O imperador passou a usar uniforme e chapéu ao estilo de Napoleão e sua esposa parecia uma imperatriz ocidental.
Antes do decreto do imperador, a estética da maquiagem que marcou o nascimento do gosto japonês passava uma incerteza melancólica, uma oposição entre sensualidade e inexpressividade, uma correlação estreita entre a beleza e a tristeza – não que a opção do imperador pelo gosto ocidental fosse uma proposta mais alegre, e na verdade seu único objetivo era a política internacional. Hoje em dia, explicou Buisson, as japonesas tradicionais preferem uma maquiagem não muito forte. As gueixas e as maikos (uma dançarina, uma aprendiz de gueixa) usam sempre uma maquiagem branca espessa, enquanto os atores de kabuki aprofundam os mistérios de seus personagens com uma maquiagem muito expressiva e tão cheia de simbolismo quanto as máscaras do teatro Nô chamada kumadori. Mas existem momentos em que esse ritual da maquiagem tradicional dialoga com o mundo contemporâneo. Na dança butô, a maquiagem total conecta o corpo ao elemento primitivo, ao mesmo tempo inscrevendo-o totalmente na modernidade. Nessa forma teatral, que segundo Buisson alguns chamam de “pós-Hiroshima”, o gesto convulsivo substitui a lentidão do Nô. Embora algumas vezes o vestuário do butô se assemelhe aos do Nô ou as poses do kabuki, quando o corpo é apresentado totalmente nu, geralmente ele está coberto pelo branco da ausência um pelas cinzas da lembrança.
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Ricota de Pasolini
1. BUISSON, Dominique. Le Corps Japonais. Paris (?): Hazan, 2001. P. 92.
2. Idem, pp. 89-91.
3. Ibidem, p. 100.
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Do Samurai ao Kamikaze
Ricota de Pasolini
1. BUISSON, Dominique. Le Corps Japonais. Paris (?): Hazan, 2001. P. 92.
2. Idem, pp. 89-91.
3. Ibidem, p. 100.